no bar
- Lola
- 26 de mar. de 2016
- 2 min de leitura

Se você é introvertida e não é Lola, embora tenha chegado animada – no ar sempre um leque de possibilidades – percorre a noite passando por uma seqüencia de momentos que se alternam e repetem de forma mais ou menos intensa:
Cumprimenta e conversa quando apresentada a pessoas conhecidas
Da risada dos comentários
Olha em volta
Pega uma cerveja
Conversa com a amiga.
Retifica disfarçadamente o batom
Fica de fora de algumas conversas que não consegue acompanhar porque a música não lhe deixa ouvir com clareza suficiente para superar o distanciamento da língua sempre um pouco estrangeira, nunca completamente própria – não bastam as palavras chave para boas inferências.
Vai para o banheiro.
Olha as pessoas em volta
Pega uma cerveja.
Conversa com a amiga.
Pensa em talvez ir embora, daqui a pouco.
Retifica de novo o batom.
Concentra-se na conversa.
Pensa em outra cerveja.
Olha em volta
Melhor ir embora.
Se você, mesmo sendo um pouco tímida, é Lola, antecipa com esperteza a utilidade imensa de um chapéu e o incorpora à indumentária. Escolhe o mais sugestivo, provavelmente vermelho, o coloca sobre seus cachos escuros, e pronto. Entra no bar e desiste logo da rotina de olhar em volta, tomar cerveja, ir no banheiro, voltar do banheiro, olhar em volta de novo, falar quatro palavras com os amigos da amiga; esquece de tudo e se passeia pela sala. Quando não sabe o que fazer, sorri. Da risada com a amiga. Sorri de novo ao amigo da amiga que lhe olha de longe, os dois tímidos. Mas desiste logo dessa rotina tediosa e muda para Alaska. Alaska é outra coisa.
Lá o bar tem uma pequena pista em penumbra perto da janela de madeira que se debruça sobre as árvores e o frio. Tem comida caseira no balcão do bar, perto da lareira, e ali ela belisca qualquer coisa, morta de fome, e come com vontade, sem se preocupar nem um pouco por sua amiga não estar com ela. Saboreia cada pedaço e o vinho e fica linda com seu chapéu e seus lábios vermelhos, e suas bochechas também quentes do calor do bar.
Olha para as pessoas na pista e se limita a curtir dos próprios gestos, da comida, do vinho, do cheiro da floresta nas roupas dos homens penduradas no cabideiro perto da lareira e do vento gelado que entra cada vez que alguém abre a porta para sair. Ela retoca seu batom, da outro gole de vinho e quando começa o swing dança, dança e pede um cigarro a um homem bonito e doce, de mãos grandes que escolhe música na máquina. Então dança. É só dançar e sentir a música. E sorrir um pouco, sorrir quando o homem a olha. E pronto. Não esperar nada. E se for, parar a tempo para não se entediar. Ou não parar. Depende. Não precisa de mais nada. Não é num bar que os tímidos triunfam. Mas o chapéu e Alaska ajudam.
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